O CÍRCULO (Suíça, 2014) – Às sombras do nazismo e sua repreensão sexual, um grupo de homossexuais consegue manter por mais de 25 anos um grupo fechado em Zurique, na Suíça, onde pudessem reunir-se naturalmente sem serem desrespeitados. Além de servir como ponto de apoio aos gays, O Círculo também possuía como principal atividade a manutenção de uma publicação homoerótica voltada para os membros (cujos endereços cadastrados eram requisitados pela polícia a todo o momento) e organização de um baile anual gay.
Entre seus membros estavam Ernst Ostertag, professor de uma escola para meninas e filho de pais extremamente conservadores e o cabeleireiro e drag queen Röbi Rapp, que tinha uma ótima aceitação por parte de sua mãe. O relacionamento entre os dois sobreviveu ao fim de O Círculo e do nazismo, ao mesmo tempo em que a união incentivou a criação de um novo grupo: Club 68.
A inclusão dos depoimentos dos verdadeiros personagens que inspiraram o longa o enriquece bastante, tendo o espectador uma mescla entre ficção baseada em fatos reais e documentário, o que também abrange a utilização de fotografias reais da época em P&B ou de fotos dos próprios Ernst Ostertag e Röbi Rapp com seus respectivos atores.
Quanto a dura realidade que enfrentaram nas décadas de 50 e 60, pouca se altera ao que é visto em pleno século XXI, principalmente no que se refere à Ernst que só veio assumir a sua condição após a morte de sua mãe, assim como os dois realizaram o primeiro casamento entre pessoas do mesmo sexo da Suíça em 2003.
NOTA: 4/5
PAIXÃO MÓRBIDA (Japão, 1964) – Cores primárias vivas iluminam rostos de mulheres japonesas. Naquele beco escuro iluminado apenas pelas luzes de propagandas, elas esperam pelo próximo cliente, estáticas num canto qualquer. A inocente Yoshie de 19 anos caiu no mundo da prostituição meio que pelo acaso após conhecer Eiji num bar onde ela fazia o turno da noite.
A violência do homem a forçava a se prostituir para ajuda-lo a pagar uma dívida de jogos com a Yakuza. O amor que criava nela uma fidelidade irracional por Eiji (apesar de toda a estupidez dele) mais a truculência na forma de agir e cobrar da máfia japonesa impedia que ela pudesse abandonar essa sobrevivência humilhante. Nem mesmo com o surgimento de Fujii, um arquiteto bem sucedido e um cliente recorrente em busca de seus serviços sexuais disposto a quase tudo para tirá-la daquele beco.
A indecisão entre o desejo de uma nova vida próspera que tanto almejou e o sentimento de traição com um possível abandono de Eiji à sua própria sorte não é uma decisão fácil para Yoshie, um dilema que se repete várias vezes. Nem mesmo uma terceira escolha possível apresentada pelo desfecho demonstra alguma possibilidade de felicidade.
NOTA: 2/5
AS PONTES DE SARAJEVO (França, Bósnia, Suíça, Itália, Alemanha, Portugal, Bulgária) – Sarajevo, capital da atual Bósnia, foi o palco do gatilho inicial da Primeira Grande Guerra, conflito mundial cujo início completou 100 anos recentemente e que matou mais 19 milhões de pessoas.
Para realizar uma homenagem não oficial desta data, As Pontes de Sarajevo é constituído por treze recortes relacionados à cidade, direta ou indiretamente, a partir da visão de diretores diferentes. Exatamente por isso, os protagonistas desses microfilmes são tão diversos entre si: os militares são a grande maioria; a observação do cotidiano de Sarajevo sobreposta por imagens de homens armados possivelmente mortos; a discussão de um casal de certa idade sobre a Europa como um todo a partir da leitura de um livro ou narrações em primeira pessoa.
No entanto, a angústia e a tristeza são uma constante em todas as visões apresentadas. Mesmo nos dois últimos trechos que utilizam mais o humor em sua narração. Um belo apanhado de imagens a se contemplar.
NOTA: 4/5
A MOÇA, A BABÁ, O NETO BASTARDO E EMMA SUÁREZ (Espanha, 2014)– O filme espanhol de título quilométrico justifica o motivo de seu nome, já que cada personagem ali citado ganha a sua importância e possui o seu arco dramático, sendo todos protagonistas, exceto Emma Suárez, cuja citação funciona apenas como homenagem (e uma pequena participação) à atriz espanhola de extenso currículo.
A “moça” Júlia possui um bebê de menos de 1 ano de idade fruto de um estupro. Como trabalha todo o dia fora, ela tem confiança em Carol, a “babá”, uma jovem atriz em início de carreira que ainda enfrenta problemas de autoestima para se entregar por inteira em cima dos palcos. Com o nascimento do neto, a avó começa a visitar a filha com mais frequência. Uma aproximação que incomoda e muito Júlia, pois foi a justamente a ‘ausência’ da mãe que causou tantas mágoas ainda não superadas.
O filme espanhol funciona muito bem como uma contemplação dessas personagens e as suas respectivas buscas por uma resolução para os seus problemas. Mesmo quando não há uma. Em certos momentos, isso ocorre embrulhado por um silêncio absoluto. Também impressiona a forma que a produção atinge seus ápices dramáticos (sempre envolvendo mãe e filha) que ocorre de forma rápida e pungente.
NOTA: 4/5
AS NOITES BRANCAS DO CARTEIRO (Rússia, 2014) – A profissão de Lyokha proporciona um contato direto e diário com seus vizinhos, todos habitando às margens de um lago, ao norte da Rússia, que os separam do restante do mundo.
Em sua rotina, o carteiro atravessa esse lago constantemente em busca das correspondências e de outros produtos que alguém daqui venha precisar. Além de um mero entregador de cartas, esse senhor torna-se um grande amigo para todos aqueles que visita, principalmente com uma de suas ex-colegas de escola (sua eterna antiga paixão) e seu filho.
A partir do momento em que o motor de seu barco é furtado, Lyokha estreita ainda mais a sua relação com o garoto, numa das raras ocasiões em que algo se altera nessa distante comunidade. O carteiro ainda terá que enfrentar outra mudança mais significativa (ao menos para ele) por ali, quando então tudo continuará no mesmo ritmo. E este filme russo consegue retratar tais passagens sem se tornar entendiante.
NOTA: 3/5